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A direita brasileira precisa realmente relembrar a ideia de meritocracia?

Não que eu seja muito velho - afinal, não cheguei aos trinta anos ainda - mas lembro-me de que, há não muito tempo, quando a então lei das cotas estava em discussão no Congresso, um grupo que, mais tarde, se conviria chamar de direita brasileira, era bastante aguerrido na oposição à medida, exaltando a ideia de que cada cidadão deveria ter seu lugar ao sol - ou, no caso, na universidade - em função de seus resultados obtidos no processo de seleção.

Não que eu não conhecesse (e defendesse) essa ideia antes, mas, desde então, passei a entender que, como neófito na ainda embrionária direita, esta era defensora da meritocracia, que, diferentemente do espantalho criado pela esquerda de resumir o conceito à recompensa do esforço puro e simples, é a ideia de este esforço atender uma demanda da sociedade ou de uma parcela desta ser premiado.

Os anos se passaram, vi a esquerda brasileira entrar em franca decadência e um presidente assumidamente de direita ser eleito (que, deixo claro, foi a melhor opção que tínhamos). No entanto, parece que um setor da hoje já crescidinha direita brasileira, seja por lapso de memória ou por conveniência ideológica, parece ter se esquecido da ideia de meritocracia.

Antes de chegar ao ponto principal, é preciso frisar que, independente de paixão ideológica, governar é entregar resultados. E, tendo em vista o sem-número de necessidades urgentes e importantes que o país possui, fazer questão de entregar alguma coisa rapidamente - mesmo que um paliativo - a fim de atender aqueles que, de uma forma ou outra, dependem das ações do poder público. Só então, depois de feito isso, é que se foca em outras pautas que, mesmo sendo importantes, não são (tão) urgentes.

Alguns ministros, em maior ou menor grau, seguem este princípio: Tarcísio Gomes de Freitas, Ministro da Infraestrutura, tem se notabilizado pela retomada (e entrega) de obras paradas há anos, bem como pelo andamento acelerado das concessões; Paulo Guedes, na Economia, a despeito de recentes episódios de incontinência verbal (ver aqui e aqui), tem capitaneado a agenda mais reformista desde o Plano Real; Sérgio Moro, na Justiça e Segurança Pública, ainda que tenha enfrentado alguns reveses - alguns deles, infelizmente, chancelados pelo presidente -, segue firme na tarefa de reduzir os índices de violência (10 mil homicídios a menos num país como o Brasil é de se tirar o chapéu). Todos eles fazem a diferença para o país nas respectivas áreas de atuação, e seus esforços atendem pelo menos algumas necessidades da sociedade.

No entanto, outros ministros têm se notabilizado não só por não apresentarem nenhum resultado relevante em suas respectivas áreas, mas criarem ruídos desnecessários - e constrangimentos - para o governo. Ou, ainda que apresentem um ou outro trunfo, as atuações erráticas e problemáticas acabam nublando os feitos positivos.

Cito três nomes, em especial, que atendem esse ponto anteriormente descrito: Ricardo Salles, do Meio Ambiente; Ernesto Araújo, das Relações Exteriores; e Abraham Weintraub, da Educação. Um se notabiliza pela postura leniente frente a infratores na área; outro, por executar uma postura de alinhamento quase automático aos EUA e Israel, sem garantias de contrapartidas proporcionais para o Brasil - isso sem falar nos ruídos desnecessários com os países árabes e a China, felizmente contornados); e outro, por dedicar seu precioso tempo a “mitadas” nas redes sociais, sem apresentar algo que minimamente se pareça com um plano para sua área.

No entanto, a despeito do pífio desempenho em suas respectivas áreas, não é incomum encontrar pessoas que defendam a permanência deles, por uma razão que acabou virando um mantra para alguns: a “guerra cultural”.

Não, não estou dizendo que ela não é importante. Não vou negar a penetração das esquerdas no debate de políticas públicas, bem como na execução delas, até porque esta apresenta evidências de ser pública e notória. Em áreas como a educação, por exemplo, trata-se de um bunker poderoso a ponto de interditar a simples - e natural - discussão de ideias para melhorar a área.

No entanto, o argumento da guerra cultural tem sido usado como muleta para justificar a (quase) ausência de ações relevantes de tais ministros nas áreas em que são gestores. Se a Amazônia está pegando fogo e os órgãos de proteção ambiental demoram a reagir, basta acusar alguma ONG; Se os EUA agradecem ao nosso alinhamento quase automático com alguma medida que nos prejudica, é só agarrar-se a algum trecho isolado para tentar contar vantagem; Se temos problemas em série - os piores em dez anos - no Enem, é só alegar sabotagem. O inferno, pelo visto, são sempre os outros…

Antes que me questionem, cabe destacar aqui que não estou dizendo que o governo não precisa se preocupar com o fator ideológico na escolha de seus ministros. Afinidade com o programa de governo aprovado nas urnas é o mínimo que se espera. No entanto, a partir do momento que este se torna o único item que garante a permanência de quadros que mais atrapalham que ajudam o governo, tem-se uma postura que não difere muito da “velha política” (aspas, uma vez que detesto usar este termo) que se criticou tanto.

É preciso que uma parte da direita brasileira retome a coerência e defenda uma gestão meritocrática nas diferentes pastas do governo, a começar pela atuação dos próprios ministros. E é lamentável precisar relembrar algo que chegou a ser defendido com tanto afinco.


Foto por Valter Campanato/Agência Brasil


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